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Morte 
aos 
Portais

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++++++Febre da rede e paliativo contra o suposto excesso de informação, os Portais-currais configuram-se como estrutura de informação (conteúdo) que nos tratam como bois digitais forçados a passar por suas cercas para serem aprisionados em seus calabouços interativos. Devemos nos afogar em números. 

++++++O que fez da Internet o que ela é hoje foi a possibilidade de todos sermos emissores (e de qualquer coisa). Não é por acaso que pululam ICQs, web-cams e páginas pessoais as mais diversas. Essa busca de tactilidade e de emissão generalizada ampliou e fez surgir a quantidade de informações que temos hoje. Essa é a verdadeira vida digital. 

++++++O que chamam de excesso não é novo e tem mesmo uma conotação negativa e moralista. Ora, a imprensa causou esse mal estar ao aumentar o volume de informações disponíveis; e podemos falar o mesmo das bibliotecas ou da nossa banca de jornal da esquina, onde não conseguimos tratar e compreender todas as informações que estão ali. 

++++++Qual o limite para que algo seja considerado excessivo? Qual a solução para esse suposto excesso? Instituir editores e Portais-currais que nos levariam a informações já consagradas e estruturadas pela nova ordem digital? É isto que nos dizem os arautos da segurança e da mediocridade. E tudo isso para nos ajudar a não nos perdermos nas malhas da rede. Devemos insistir na perdição do afogamento, do naufrágio e não na navegação simplória rumo à um porto seguro. 

++++++O limite da emissão sempre foi o que deu poder às mídias clássicas e agora os Portais, sob a balela de nos ajudar a não nos perdermos nesse mar de dados, nos aprisionam e limitam nossa visão da rede (do mundo?), fazendo fortuna de novos jovens nasdaquianos. Dizem que tudo existe num Portal, e que não precisamos nos cansar em buscar coisas lá fora. Mas quem define o que é tudo? Voltaremos à edição clássica dos conteúdos que fez o quarto poder dos mass media? 

++++++Embora busquem agregar supostos conteúdos importantes, os Portais nos tiram, enquanto fenômeno hegemônico (e é aqui que quero situar minha crítica) a possibilidade da errância, da ciber-flânerie, nos transformando em surfers-bois, marcados pelo ferro do e-business. Devemos reverter a hegemonia e a pululação desta nova prisão eletrônica que se configura com a atual onda de Portais-currais. 

++++++A palavra Portal tem uma conotação mística, como porta de passagem, como canal que nos abriria a outros mundos, a novos universos possíveis e impossíveis. O que está acontecendo agora não é a abertura ao imprevisível, ao excessivo e ao desmesurado, mas fechamento ao mesmo, à nossa limitação ignóbil que só busca a certeza, a segurança e a repetição.

++++++Contra a febre de emissão que criou e dá vida à rede, os Portais estão tentando nos fazer coach-potatoes digitais que se acham felizes por encontrar aquilo que procuram e que pensam em se manter na segurança de suas limitações, não estando dispostos à perdição do imprevisto. 

++++++Pela sobrevivência da vida e da emissão irrestrita no ciberespaço, deve-se gritar a morte simbólica dos Portais-currais que tratam o que é excessivo de forma moralizante, desviante, improdutiva ou dispersiva. Esqueceríamos assim que é esta despesa improdutiva que estrutura e dá alma a qualquer agrupamento social. A assepsia, a certeza e a segurança são sinônimos de morte, na rede e fora dela. 

++++++Esperamos então a rebelião dos bois marcados em ferros de bits e bytes. Que eles possam arrebentar os currais digitais e as amarras dos infelizes Portais. Senão estaremos para sempre presos nas garras do banal, do mesmo ou do instituído, achando apenas o que procuramos, perdendo a possibilidade de cruzar com o inusitado que poderia balançar nossas certezas e nos fazer um pouco mais ricos e complexos. 

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André Lemos, Porto Alegre, junho de 2000 

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